quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Crônica de um 8 de março. Que Deus proteja Hamiltão, o ateu


Pequenas explorações do dia a dia

De fato, as mulheres são vítimas de tremenda opressão. Sem falar das pequenas explorações que sofrem diariamente. Coisas como o marido de bermudão, espichado no sofá, pedindo cafezinho.
O infame devia se levantar, ir à cozinha, pegar o café, tomá-lo e depois – o mais importante – lavar a xícara. Isso levaria qualquer feminista a vibrar, caso não fosse negativista: “É, mas o café quem fez foi ela.”
Nas últimas décadas certas feministas têm feito a maior confusão. É que elas mesmas nunca souberam determinar o que combater. Ou o que conquistar.
Algumas das que conheço vivem em estreitos círculos pensando que a tarefa delas se resume em educar companheirinhos, e não perdem pretexto para dar suas lições em público.
Certa vez, em São Paulo, fiz reservadamente uma brincadeira quase ingênua (para o meu padrão), e uma então respeitadíssima líder nacional baixou sermão de acordar gigante adormecido. Eu dissera apenas que ela estava vestida com roupa ideal para tirar com os dentes. Qual o machismo que há nisso?
Assédio? Sinceramente, eu tinha coisa muito melhor para encarar. Aliás, feministas aqui de Goiás andaram recuando na questão do assédio sexual. Até distribuíram panfleto tentando nos convencer de que, no fundo, o que elas queriam mesmo é ser cantadas.
Afinal, haviam botado tanto terror na negrada que nenhum macho queria ir parar em delegacia de mulher só por reivindicar o que elas estavam doidas para dar.
Já imaginou gato no cio caminhando pelo telhado sem miar, esperando intervenção divina para inseminar a fêmea? Quem não mia não papa. E o miado pode ser mesmo sossegada bolinadinha à mesa de boteco.
Interessante é que os machos emudeceram e elas ficaram mudas no que diz respeito a matar mútuas vontades. É que, como é de secular tradição, elas acreditam – mas não sabem que acreditam – que a iniciativa tem que ser do homem. Só que, se o homem iniciar e houver alguém por perto...
As bravas combatentes perderam precioso tempo de luta e de prazer com esse negócio de assédio. Lembro-me de um caso de repercussão nacional. Em festinha de confraternização, lá pela alta madrugada, depois de entornar umas tantas e dançar coladinho, pezinho-de-rabo inocente pediu carona ao chefe.
No carro, sozinhos, o clima estava formado. Pelo menos foi o que pensou o jovem chefe, sexualmente em perfeitas condições (suponho), como teria demonstrado ao fazer o banalíssimo convite: “Vamos a um lugar tranquilo para que possamos nos conhecer melhor?”
Veja que elegância! A mocinha, no entanto, recusou, ato pelo qual não se pode condenar ninguém. Ainda com elegância, ele disse que estava tudo bem. E a levou para casa. E a casa era a dela. Não pediu nem beijinho de despedida.
Mas eis que, a partir do dia seguinte, o abominável chefe, qual tarado de festinha de aniversário de criança, estava na boca do mundo e, principalmente, na de feministas.
A tese era a de que, pelo simples fato de ser chefe, o celerado cometera atroz assédio sexual. Portanto, delegacia e humilhação pública para aquele desgraçado portador de hormônios.
Mas, como eu dizia, elas sofrem pequenas explorações que, do ponto de vista de princípios, não são menores do que a exploração de que são vítimas nas relações de trabalho. A “classe” masculina já se libertou e os homens não deixam o “gênero” feminino se liberar.
Não dá para enumerar as pequenas explorações do dia a dia. É na sala, é na cozinha, é no banheiro. Mas na cama o sujeitinho pia fino, porque ali é território dela. Quando ela diz “Não dou”, não há cão que faça a danada afastar os joelhos.
A não ser uma boa negociaçãozinha. É dali, da cama, que saem umas maravilhosas férias na casa da mãe dela (à qual o infeliz é obrigado a ir, pois, se não for, a mulher fica por lá mesmo), um par de sapatos, um vestido e até mesmo uma caderneta de poupança, isto é, se sobrar algum.
Nossas queridas são, de fato, oprimidas, humilhadas e exploradas por nós. Mas, no dia de homenageá-las, abrandemos nosso espírito machista. Elas merecem, além do amor, um pouquinho de festa, embora este dia deva ser de luta e de conscientização.
É claro que quem me conhece sabe que não lhes presto homenagem apenas uma vezinha por ano. Dedico a elas todos os meus dias e, principalmente, todas as minhas noites. Acontece que, ingratas, elas nem sempre correspondem.

Hamilton Carvalho
(Gazeta de Goiás, nº 49, 8/3/1998)

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