segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Mais uma vez, ainda que sem querer, Hamiltão revela o seu amor pela humanidade


Os “Paquitos”
                        
O cara simplesmente morreu.
Eu descidinho do ônibus, caminho de casa, bateu-me no cérebro carunchado o início da crônica que pretendia escrever: “Pelo amor de deus, que a atriz Xuxa Meneghel não me processe.” Não é lá grande começo, mas eu tinha que fazer alguma coisa ante o furor do leitor abandonado. Assim, como diria Zé de Alencar, estuguei o passo.
Mas, alguns metros depois que desentortei a esquina da estreita rua do bar do Tião, vi uma das personagens que seria ligeiramente mencionada no texto. Então resolvi dar uma chegadinha ao bar para saber mais a respeito dela. E a crônica se perdeu, ou se adiou.
Em resumo, eu iria falar de um grupo de rapazes que decidiram entrar para a iniciativa privada. Todos irmãos, oito. Parecidíssimos uns com os outros. Só não diria que são óctuplos por causa das pontas: o mais velho é mais alto e o mais novo é mais baixo que a planície intermédia. Mas todos pequenos.
Por falar em óctuplos, a “octomãe” estado-unidense Nadya Suleman é mesmo uma desnaturada. “Odeio bebês, eles me dão nojo”, declarou com desenvoltura à revista Touch. Ah, sim, leitor, não podemos julgar “açodadamente”; afinal, nada do nosso DNA provém do juiz Gilmar Mendes. Sem mencionar o fato de que ela tem o antecedente já prolífico de seis filhos, que qualifica de “animais”. Se tomar por base a infância de dois sobrinhos que tenho...
Bem. Voltemos ao assunto.
Os rapazes alugaram o cômodo pegado ao bar de Tião que antes fora o consultório tocado por uma detistazinha recém-formada. Nos bons tempos do caça-níquel que havia ali na área externa do bar, uma vez ela e eu... Meu deusim do céu.
Então. Os irmãos pretendiam prosperar no negócio de frutas e legumes e, numa bela noite de quinta-feira, instalaram, em ângulo reto, dois tabuleiros na área coberta que abrange a frente do bar e a da sala que alugaram de Tião, a que servira de consultório para a dulcíssima morena, na quina do imóvel, a partir de onde, às quintas, se realiza a feira-livre noturna do bairro.
Com preguiça de descer a comprida feira para comprar umas laranjinhas mais em conta, resolvi me abastecer ali mesmo. Olhei para a casca ressequida das laranjas, para as bananas empretecidas, para as beterrabas empoeiradas, para os repolhos desgrenhados, hesitei. Eram xepa.
É preciso que, agora, eu tome o leitor pela mão, pois a esta altura há por onde se perder.
Não fui eu quem apelidou de Paquitos os novos empresários do ramo hortigranjeiro. Deduz-se logo: foi o vendeiro Tião. De início, não entendi por que Paquitos. O encanecido leitor se lembra de que os rebolativos meninos que participavam de programa de televisão apresentado por Xuxa eram loirinhos.
Os ex-verdureiros (o próspero negócio durou menos de uma semana) são bem morenos, cabelos pretíssimos e escorridos. Parecem quadrilha de bandidos mexicanos em filme hollywoodiano. Solícito, Tiãozinho explicou.
Dada a uniformidade da aparência, seriam versão em papel carbono dos fremebundos garotos. Discutir quem há de?
Ah, rapazes que eram um carisma só, os Paquitos do Tião. Em torno deles enxameavam notórios tomadores de cachaça do pedaço. É verdade que notei a ausência de Zero-a-Zero, que se sentiria bem à vontade naquele grupo.
No entanto, havia um estranho. Apareceu, simplesmente, e se apegou ao lugar, e ali permaneceu mesmo depois da dissolução da confraria. Até que, simplesmente, morreu.
Prometo ao leitor que voltarei ao assunto. O assunto me engasga.
Não acredito que a Xuxa vá me processar por uso indevido da marca Paquitos. Em última instância, conto com que as aspas no título deste texto me livrem de advogados sedentos de sangue.

Hamilton Carvalho