O teste Paulo Coelho
Meu pai era dono de certas verdades. É claro que nem sempre se podia
levá-lo a sério, mas que ele tinha suas filosofias, ah, lá isso tinha.
Quando, por exemplo, ouvia alguém com
maledicência, a falar de conceituado membro da sociedade, o velho tacava: “Ora,
só porque o coitado deu duas ou três vezes...”
Não vou dizer que concordo com isso.
Mas a revolta dele deve ser justa, já que o autoajudador Paulo Coelho confirmou
à Folha de S.Paulo, recentemente, o que dissera a repórter
espanhol: deu “exatas” três vezes para se testar. [As aspas são pedidas
nesta republicação; o autor observa que o exato seria “exatamente”.]
Segundo ele (o bom jornalismo nunca
dispensa o “segundo ele”, pois aqui ninguém é besta), segundo ele, não gostou.
Agora está credenciado para ajudar o mundo inteiro alquimicamente.
No entanto, teste não quer dizer muita
coisa. Eu, por exemplo, já passei até em teste psicotécnico, embora nem saiba
que diabo é isso. Só não fiz teste de QI por medo do complexo de burrice.
Também não fiz o teste da farinha,
porque sei de minha vida e do que tenho feito.
Se houvesse lei impondo tal teste,
muita gente que conheço ia revelar esfíncter mais careca que pneu de fubica.
O leitor, de vasta cultura, deve saber
do que falo.
Pega-se farinha bem fina, de
preferência farinha do reino, e espalha-se a dita sobre superfície lisa,
uniformemente. Depois, tira-se a roupa do testando (meu deus) e fá-lo (meu
deus) sentar-se no preparado.
Existe sujeitinho que nem precisaria do
teste. Bastava a gente dar uma olhada no fundo da cueca dele. Se aparecesse
aquele sinal assemelhado com rastro de pneu de bicicleta [evidentemente
pneu novo], o resultado seria “negativo”.
Desse modo, neguinho não precisaria do
sofrido e repetido Teste Paulo Coelho.
Não, leitor malicioso, não me venha com
essa de pretexto.
Se você acompanha desde o início esta
minha jornada nas páginas da Gazeta, deve lembrar-se de Gabiru. Ele
não procurou pretexto nenhum. Simplesmente botou a culpa na danada da maconha.
Sucede que a motivação de Paulo Coelho
teria sido, digamos, “endógena”. Quis provar a si mesmo que não era (ou era)
bicha, embora tenha “confessado” como se a coisa interessasse ao mundo, não
informando, porém, se o resultado fora negativo ou positivo.
Do jeito que ele é lido e seguido... O
assunto pode dar até obra literária: Na Rombuda Ele Sentou e Chorou.
O best-seller viria seguido de outros: Na Rombuda Ele se Empurrou e não
Chorou e, por fim, Ele Gozou Sentadinho.
A trilogia do resultado “positivo”
poderia ser sintetizada em obra de maturidade, O Alpinista de Vara.
Obra de fazer inveja a Umberto Eco.
Oh, não, leitor amante de magias, não
estou tentando desqualificar seu autor preferido. É que em certos dias a gente
está mesmo é para avacalhar.
Hoje acordei meio atravessado com a
vida, profundamente negativista. A primeira coisa que fiz no banheiro foi falar
mal de mim diante do espelho. Recomendei-me que me aposentasse como cronista e
fosse redigir necrológios para o Diário da Manhã.
O problema é que não passaria no teste
(de redação), porque sou daqueles que gostam de falar mal de quem já morreu.
“Dr. Fulano de Tal, salafrário que passou a maior parte da vida a malversar
dinheiros públicos...”
Poderia, mesmo, fazer mais de um teste
e, acatando conselho de alguém bem sintonizado com o viver, mudar o jeito de me
expressar. Mas aí teria que renegar a régua e o compasso que me desenharam.
E, como diria o letrista Vinícius de
Morais – ao aplicar cantada musical em dama do pedaço dele –, não se vive mais
do que uma vez.
A vida não é teste. Muito menos do tipo
que possa ser repetido duas vezes sem maiores danos... Bem.
Se meu pai era dono de certas
sabedorias, minha mãe também tinha as dela. Lembro-me de quando eu dava minhas
malinadas. A sábia senhora advertia, sempre com aquela “fraqueza” de querer dar
mais uma oportunidade: “Nas três o Diabo fez.”
Não havia mago que desfizesse esse
princípio eterno.
Hamilton Carvalho
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