quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Hamiltão, aqui, demonstra não ambicionar largos voos. Anda preocupado com o preço da passagem no transporte coletivo terrestre


A turbulência dos gases

Hoje, meio caidão para o deprimido, pensei em jogar-me na Ladeira do Vento e desentortar-me na transversal que leva ao Bar do Warllen. Mas me ocorreu este encontro com o leitor, de quem ultimamente me vejo a esquivar. É bom chegar aqui, é menos deprimente que dívida de boteco.
Mesmo assim era preciso assunto, e o que bateu neste espírito conturbado me fez hesitar. Veio de uma notícia: “Cientistas concluem que soltar gases durante viagem de avião faz bem”.
Ora, tema correlato me apareceu dias atrás, quando soube que povo laborioso se preparava para lançar no mercado um tipo de calcinha (ou cueca, ou os dois) à prova de peido, ou melhor, que filtra os odores característicos da flatulência. Descartei o assunto.
É que alguém havia chamado a atenção para o meu descambar para o escatológico (embora, no presente caso, não seja bem assim, pois peido só pode ser devidamente dimensionado a partir de questões socioculturais, além, é claro, dos aspectos fisiológicos).
Busquei confirmar o teor do alerta. Não fiquei muito convencido de minha suposta escatologia com base apenas em textos como “Curva de rio”, “Zero-a-Zero”, “Líquido e certo” e os que deixei de escrever em continuação a cada um deles.
Peço ao leitor que espere um pouco.
Ao repassar sob os olhos os últimos textos aqui incluídos, dei com “Miriã”, sobre uma garota que conheci “no bar do Uárlen”. Se o pressuroso leitor erguer a vista até a cabeça desta olorosa crônica, verá Warllen, com dáblio e dois eles. É que ontem, a caminho da farmácia, vi que o meu amigo botequineiro mandara colocar vistosa placa informativa na fachada do estabelecimento, marcando, definitivamente, a existência de uma entidade de respeito. Por isso, agora, o bê maiúsculo do bar.
Sim, de volta. Especificamente quanto a peido, não precisei pesquisar para saber que já escrevera texto em que toco na gasosa matéria, porque está no comecinho de Vida Cambaia (“Que medicina legal!”) e envolve, como este, o prestígio da ciência.
O que me deixa encafifado na reportagem de hoje é a observação a respeito do peido feminino. Segundo “algumas das mentes mais brilhantes da área”, sob a coordenação do gastroenterologista dinamarquês Jacob Rosenberg, o resultado do estudo “foi uma profunda revisão da literatura científica sobre flatulência, olhando para questões sobre por que os gases das mulheres têm cheiro pior que os dos homens”.
É, realmente, algo profundo, só pode. Isto porque sopra no mesmo rumo de conclusões publicadas em 1973 por um mestre da Universidade Católica de Goiás (hoje pontifícia) em livro intitulado Aulas de Medicina Legal. Ao discorrer sobre causas da impotência sexual masculina, o professor Benedito Soares de Camargo Júnior enumerou, entre outras pérolas de brilho científico:
“... um pequeno travesseiro, sujo e fétido, que o marido conserva há vinte e seis anos; uma boneca de porcelana que deveria dormir entre o casal; a presença da mãe ou irmã mais velha no quarto do casal na noite de núpcias; a luz acesa no quarto; o toco de cigarro; a halitose e a desidrose (hidrose) e, finalmente, duzentos flatos sulfídricos todas as noites.”
Sempre solidário com a mulher, a ponto de peitar a ciência, ponderei se a causa da impotência não estaria no fato de o homem passar as noites contando peidos em vez de se dedicar aos ardores da paixão.
Acredito que voltarei ao assunto. A esta altura, pergunto-me se não seria mesmo o caso de dar uma chegadinha ao Bar do Warllen.

Hamilton Carvalho

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